Refundar o memorando com a Troika ou Revisão
Constitucional?
Com o discurso de fecho nas jornadas parlamentares PSD/CDS,
o 1º Ministro usou uma expressão que tem provocado um “terramoto” de opiniões e
de dúvidas sobre o que quereria dizer quando a utilizou. Vieram a terreiro
vários conhecidos da vida política acusando-o de, com isso, estar a dizer que
quereria fazer uma revisão Constitucional. Fiquei curioso e, ao mesmo tempo
espantado, com o problema causado por essa expressão: Refundar. E utilizou-a
relativamente ao memorando da Troika e não a nenhuma revisão Constitucional.
Devido às dúvidas causadas em pessoas que, supostamente não as deviam de ter
tido, resolvi ir pesquisar o significado dessa expressão, não fosse ser eu que
estivesse enganado. Pois bem, o que eu encontrei foi o seguinte:
Refundar –
1. Tornar mais fundo. Afundar, aprofundar
2. Tornar a criar, a estabelecer algo; fundar novamente.
Ora bem, desfeitas as dúvidas, fico a saber que refundar o
memorando da Troika, não significa automaticamente qualquer refundação da Constituição.
Poderia pensar que o 1º Ministro teria querido dizer várias coisas, mas nunca
que pudesse automaticamente estar a dizer que se teria que alterar a
Constituição. Claro, a não ser que eu quisesse causar de imediato quezílias e
mau estar, para procurar notoriedade jornalística e tirar proveito político de
qualquer natureza.
De qualquer forma, ainda que, para se fazer uma revisão profunda
do memorando da Troika, se acabe por ter que rever algumas situações previstas
na Constituição, não sei porque é que isso terá que provocar, como já o está
fazendo, tanto alarme e convulsão entre os mais diversos actores políticos.
A Constituição Portuguesa, pelo que sei, teve o seu início em
1822, ainda na Monarquia. E nela constavam vários princípios entre os quais os
que consagravam os direitos e deveres individuais de todos os cidadãos
Portugueses (dando primazia aos direitos humanos, nomeadamente, a garantia da
liberdade, da igualdade perante a lei, da segurança, e da propriedade) bem como
o princípio fundamental de consagração da Nação (união de todos os Portugueses)
como base da soberania nacional, a ser exercida pelos representantes da mesma
legalmente eleitos. Outros havia que, em função com os tempos, foram sendo
modificados e que deram origem a várias revisões. A Constituição de 1822, pouco
tempo depois foi alterada com a Carta Constitucional da Monarquia Portuguesa de
1826. Depois, foi novamente revista e alterada em 1838. Em 1911, após a
implantação da República, que queria trazer a Democracia, embora ela já
existisse, voltou a Constituição a ser revista. Mais uma vez, com a queda da 1ª
República e com a instauração do Estado Novo, novamente a Constituição foi
revista e alterada em 1933. Com a revolução de 25 de Abril de 1974, que foi
feita com a promessa de nos voltar a trazer a Democracia, a Constituição voltou
a sofrer revisão e alteração em 1976. Depois disso tem sofrido alterações e
revisões pontuais que já se contam por várias ao longo dos anos. Portanto,
ainda que se tenham que se rever alguns conceitos descritos actualmente na
nossa Constituição não vejo onde está o grande “terramoto”. Por outro lado,
fala-se tanto em Democracia e em defender os princípios dos direitos
fundamentais previstos na nossa Constituição, mas sem procurar muito, encontro
logo, na nossa Constituição, o espírito absolutista e ditatorial que foi
vigente em outros períodos da nossa história e que se insere no seu Artigo
288.º, relativo aos limites materiais da revisão Constitucional e que, na sua
alínea b, prevê que qualquer alteração ou revisão, ela não se possa fazer sem
respeitar a forma Republicana de Governo. Já não bastou ter sido imposta uma República
pela força das armas, aproveitando o descontentamento existente na época, para
que, “democraticamente”, nos dias de hoje, se continue a permitir que ao povo
lhe esteja vedado a possibilidade de escolha relativamente ao regime sob o qual
quer viver e que quer para o seu País. Ou seja, podemos escolher entre a República
e a República. Que grande lição de Democracia! Hipocrisia deste nosso Estado e
destes nossos políticos que se dizem democráticos, mas que ficam logo muito
aflitos quando se pode supor ter que rever a nossa Constituição, ainda que ela
desde tempos da nossa Monarquia, tenha sofrido alterações em função do decorrer
dos tempos. Do que eu tenho medo não é da mudança, mas sim de que nunca nada
mude.